Perda de gelo na Antárctica acelera

Um estudo exaustivo do gelo da Antárctica confirma que a calote polar está a diminuir.

Só em 2006, a Antárctica perdeu perto de 200 biliões de toneladas de gelo, revelam os cientistas, o equivalente a um aumento do nível global do mar de mais de meio milímetro. Estes valores representam 75% mais que as perdas verificadas em 1996.

O estudo vem na sequência de um relatório de 2006 que também concluía que a taxa de perda de gelo devido aos glaciares derreteres e deslizarem para o mar é superior aos ganhos devido à queda de neve. Esse relatório concluía que de 2002 a 2005 a Antárctica tinha perdido uma média de 152 Km3 (139 biliões de toneladas) por ano.

"Este estudo reforça a descoberta de que a Antárctica está a perder massa, o que ainda não é um resultado bem aceite", diz Eric Rignot, perito em gelo na Universidade da Califórnia, Irvine e líder da equipa que publicou agora o novo estudo na revista Nature Geoscience. “Tê-lo feito com técnicas independentes é muito importante." Ambos os grupos usaram dados de satélite mas baseados em diferentes técnicas.

As descobertas emprestam apoio à crescente preocupação com o facto de o degelo acelerado das calotes de gelo poder fazer subir o nível do mar mais de 2 metros nas próximas centenas de anos, processos (e um cenário 'da pior das hipóteses') que o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) não incluiu nas suas predições mais recentes. A ciência, disse o IPCC em 2007, era demasiado incerta.

Andrew Shepherd, que estuda as camadas de gelo globais na Universidade de Edimburgo, diz que as descobertas de Rignot estão de acordo com as suas próprias. Para além disso, diz ele, quantifica realmente que quantidade de gelo está a ser perdida ao longo da costa.

Os climatólogos ainda estão a debater o efeito global das alterações climáticas nas duas maiores calotes de gelo, a Antárctica e a Groenlândia. O aquecimento global é acompanhado por aumentos regionais de precipitação que podem espessar as camadas de gelo, mesmo que as suas bordas derretam. Estudos prévios já demonstraram que o leste da Antárctica está a ficar mais espesso e o relatório de 2001 do IPCC previa que a calota de gelo antárctico continuaria a crescer durante o século XXI.

Existem três maneiras principais que os cientistas têm usado para estimar a redução da espessura das camadas de gelo, cada uma com os seus pontos fortes e fracos.

A altimetria por satélite, que mede simplesmente a altura a partir do solo, é útil pois existem dados a longo prazo mas é difícil medir a massa global de gelo desta forma pois não se distingue gelo compacto de neve fofa.

As medidas de gravidade têm sido uma rica fonte de dados desde 2002, quando os satélites GRACE foram lançados. Estas medições podem ser usadas para avaliar a massa de gelo ou terra mas as medições são complicadas pela ascensão glacial, a forma como a rocha debaixo do gelo tem tendência a subir ao longo do tempo.

A interferometria RADAR por satélite é muito precisa na medição de velocidades dos glaciares, a partir da qual os investigadores podem calcular a perda de gelo nas orlas da Antárctica mas não há um satélite exclusivamente para estas medições, o que torna os dados difíceis de obter.

Rignot usou dados de interferometria de 85% da linha costeira em 3 momentos no tempo: 1996, 2000 e 2006. Utilizou um modelo climático pré-existente para calcular o aumento de material no interior, que foi a parte mais incerta dos cálculos. Segundo ele, as perdas brutas de massa de gelo são muito semelhantes às perdas que já tinha calculado para a Groenlândia.

Isabella Velicogna, agora colega de Rignot em Irvine, liderou o estudo de 2006 que também mostrou que o gelo antárctico estava a diminuir. O seu estudo baseou-se em medições de gravidade e tinha mais dados mas agrupados num período menor de tempo. Ela diz que os dois conjuntos de resultados estão de acordo, "há uma tendência que é significativa".

Essa tendência, um aumento de 75% nas perdas de gelo desde 1996, está a assustar Rignot. Uma vez bem lubrificados com água, é difícil parar os glaciares, mesmo que o aquecimento global seja reduzido, diz ele. Ele estima que o cenário mais negro, um descarregar completo das bacias de gelo, resultaria numa subida de cerca de um metro de cada uma das calotes, para além do meio metro do que resta dos glaciares alpinos.

Shepherd alerta para o facto de a tendência de Rignot, obtida apenas com 3 pontos, ser projectada no futuro, pois há razões para crer que o aumento de água fria resultante do degelo perto da costa leve ao abrandamento das perdas.

Rignot concorda que a tendência pode não continuar: os factores desencadeadores e os fluxos glaciares não são bem conhecidos mas ele ainda pensa que o IPCC foi excessivamente cauteloso ao não mencionar as possibilidades de perda de gelo no próximo século. "Cada vez que olho para os dados fico de boca aberta."


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