Arrastões têm duplo alcance

Os enormes cabos usados pela pesca comercial de arrasto de águas profundas têm um impacto muito maior do que se pensava.

Esta é a conclusão a que uma nova análise dos censos às espécies de peixe, que revela declínios dramáticos na abundância dos peixes de água profunda ao largo da Irlanda.

David Bailey, da Universidade de Glasgow, lançou um novo olhar a um registo único de arrastos científicos sazonais que tiveram início em 1979 com John Gordon, da Associação Escocesa de Ciências Marinhas em Oban. Ele apresentou as descobertas a 5 de Março no encontro de oceanografia de Orlando, Florida.

Os arrastões percorreram a Porcupine Seabight, a sudoeste da Irlanda, a profundidades entre algumas centenas e 4 mil metros. "O que é realmente espantoso sobre isto é eles percorrem toda a zona desde a plataforma continental até à planície abissal", diz Jeffrey Drazen, especialista em peixes de águas profundas na Universidade do Havai, Manoa, que não participou no estudo. "É um conjunto de dados único no mundo."

Bailey comparou a abundância de peixes nos arrastos durante 1979–89 com os resultados do arrasto na mesma área durante o intervalo 1997–2002. O arrasto comercial, que tipicamente arrasta redes ao longo do fundo do oceano, aumentou muito durante este período e passou para profundidades maiores. O estudo descobriu declínios dramáticos em cerca de 50% na abundância total dos peixes ao longo dos anos.

Esta situação não é surpresa para profundidades até 1500 metros, onde a pesca comercial opera, tendo como alvo espécies como o olho-de-vidro e o peixe-rato, mas os declínios também foram dramáticos a grande profundidade, até aos 3 mil metros em alguns casos. Os resultados são igualmente preocupantes para todas das mais de 20 espécies de peixe examinadas, que incluem muitas, como as enguias, que não são capturadas comercialmente.

A causa provável dos declínios em profundidades menores, diz Drazen, é que muitas espécies de peixes de águas profundas são os migradores ontogénicos. Isto significa que passam os seus primeiros anos em águas pouco profundas e depois migram para águas mais profundas com a idade.

Por isso, o arrasto dos peixes mais jovens a uma dada profundidade pode, em última análise, reduzir o número de peixes que vivem tempo suficiente para migrar para maior profundidade. Isto é verdade mesmo para espécies sem interesse comercial, porque ser apanhado na rede de arrasto é geralmente mortífero para um peixe de profundidade, mesmo que seja devolvido ao mar.

"Ninguém tinha realmente analisado esta questão da migração ontogénica ou a forma como afecta populações localizadas abaixo das profundidades de pesca", diz Drazen, "Essa é a grande contribuição que Bailey e os seus co-autores dão."

Com base no estudo, o grupo conclui que o impacto do arrasto comercial sobre a abundância de peixe se estende mais ou menos até ao dobro da profundidade, logo para o dobro da área, onde a pesca realmente decorre, um aumento de 11% para 23% do fundo marinho. "Os impactos da pesca nos oceanos mundiais são muito maiores do que antes se pensava", diz Drazen. "Regiões do oceano que antes pensávamos estarem intocadas, ou relativamente intocadas, pelas pescas afinal não estão."

Outros efeitos negativos do arrasto de profundidade já tinham levado a apelos à proibição desta prática de pesca.

Fonte: Simbiotica

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