Ler a mente com um scan cerebral

Os cientistas desenvolveram uma forma de descodificar a actividade cerebral de alguém para determinar para o que estão a olhar.

“O problema é análogo ao truque de magia clássico do 'escolha uma carta, qualquer carta'", diz Jack Gallant, neurocientista da Universidade da Califórnia, Berkeley, que liderou este estudo.

Mas enquanto o mágico finge que 'lê a mente' da pessoa a olhar para a carta, os investigadores podem agora faze-lo realmente usando instrumentos de imagens cerebrais, os scans. “Quando o baralho de cartas, ou as fotografias, têm cerca de 120 imagens, podemos acertar mais de 90%", diz Gallant.

A técnica é mais um passo em direcção a sermos capazes de ver o conteúdo das experiências visuais de alguém. “Pode-se imaginar a utilização desta técnica na análise de sonhos ou na psicoterapia", diz Gallant. Os resultados já estão a ajudar a fornecer aos neurocientistas um modelo mais rigoroso da forma como funciona o sistema visual humano.

Se o trabalho puder ser alargado ao desenvolvimento de modelos mais gerais da forma como o cérebro responde às coisas para além dos estímulos visuais, os scans cerebrais podem ajudar a diagnosticar doenças ou a seguir os efeitos de uma terapia.

Já tinham sido realizados esforços para ler o cérebro através de imagens de ressonância magnética funcional (fMRI), mas tinham sido bastante limitados. Na maioria das tentativas, as respostas do cérebro dos voluntários tinham sido registadas primeiro quando olhavam para uma selecção de imagens e estes scans eram depois utilizados para determinar que imagem a pessoa estava a ver. Isto apenas funciona quando apenas se tem um número limitado de imagens simples e quando a resposta do sujeito a estas imagens já é conhecida.

Neste novo estudo, Gallant usou a fMRI para modelar as respostas cerebrais do sujeito a vários tipos de imagens e usou os modelos para prever as respostas a novas imagens.

“Decididamente é um passo em frente", diz John-Dylan Haynes do Max Planck Institute para as Ciências Cerebrais e Cognitivas Humanas de Leipzig, Alemanha, que também trabalha na descodificação da actividade cerebral. “Agora podemos usar uma forma mais abstracta de descodificar as imagens que as pessoas estão a ver."

Na experiência, a actividade cerebral de dois sujeitos, membros da equipa de Gallant, Kendrick Kay e Thomas Naselaris, foi registada enquanto lhes mostravam 1750 imagens diferentes. Seguidamente, a equipa seleccionou 120 imagens novas que eles não tinham visto e usaram os resultados anteriores para prever as suas respostas cerebrais.

Quando os sujeitos do teste viram uma das imagens, a equipa pode fazer corresponder a resposta cerebral real à sua previsão para identificar que imagem tinham visto. Com um dos participantes acertaram 72% das vezes e com o outro 92%. Se dependesse apenas do acaso e da sorte só deveriam ter acertado 0,8% das vezes.

O próximo passo é interpretar o que uma pessoa está a ver sem ter que escolher a partir de um conjunto de imagens conhecidas. “Em princípio é um problema muito mais difícil", diz Gallant. Precisamos de uma modelo muito bom do cérebro, uma melhor medida da actividade cerebral do que a fMRI é e uma melhor compreensão da forma como o cérebro processa coisas como as formas e as cores que observamos nas imagens complexas do dia a dia, explica ele. “E por enquanto não temos nada disso."

Tentativas anteriores apenas conseguiram modelos para a resposta cerebral a formas geométricas simples, é muito mais complicado compreender a resposta a imagens mais complexas e realistas.

Um dispositivo descodificador que possa ler a actividade cerebral pode ser usado na medicina para avaliar os resultados de um enfarte ou o efeito de um medicamento, ou ainda ajudar a diagnosticar problemas como a demência, observando a forma como a função cerebral se altera em resultado da doença ou da intervenção.

A criação de um modelo da forma como o cérebro responde aos vários estímulos também pode ser útil noutro tipo de processo neural. “É interessante observar como isto pode ser estendido", diz Haynes, que mostrou no ano passado ser possível prever qual de duas somas a pessoa esta a fazer. Mas ainda estamos longe de aplicar este novo estudo a essas situações, diz ele, porque “não temos um modelo suficientemente bom para as intenções".

Saber mais:

Jack Gallant

John-Dylan Haynes


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