De Como O Açúcar Está Degenerando A Raça Humana Ao Vivo
Em 1912, quando no mundo "civilizado" cada pessoa consumia uns 20 quilos de açúcar anualmente, o cientista francês Louis Camille Maillard, da área de tecnologia de alimentos, fazendo pesquisas sobre a deterioração de alimentos, descobriu o papel do açúcar nesse processo. Ele demonstrou que a mudança de cor experimentada por certos alimentos ao envelhecer se devia a uma reação entre açúcares e proteínas. Os "produtos finais" dessa reação eram os responsáveis pela cor marrom que intrigava o pesquisador. A descoberta ganhou o nome de reação de Maillard e consiste numa glicosilação ou glicação não-enzimática de proteínas. O grupo aldeído dos açúcares redutores, diante de oxigênio, liga-se ao grupo amina das proteínas numa reação de condensação sem necessidade de enzimas.
Em português claro: o açúcar se agarra à molécula de proteína aleijando-a, isto é, alterando sua estrutura e propriedades. O doutor Maillard, profético, sugeriu nas conclusões de seu relatório que suas descobertas diziam respeito aos diabéticos.
Meio século depois, quando cada citoyen andava consumindo uns 60 quilos de açúcar por ano, foi descoberta a hemoglobina "glicosilada" (HbA1c), depois rebatizada para "glicada". Com isso ficou claro que a glicação de proteínas não acontecia apenas in vitro, como nas experiências de Maillard, mas também in vivo. Isso mesmo, o açúcar contribui para deteriorar o ser humano em vida. A hemoglobina glicada nada mais é que uma proteína com sua estrutura alterada por uma molécula de glicose agarrada a ela. Aleijada pelo açúcar a hemoglobina fica prejudicada em sua função de oxigenar os capilares, facilitando a necrose.
A indústria da doença não viu nada de mais nessa descoberta, e até arranjou uma utilidade prática para ela: a hemoglobina "glicosilada" serve para indicar o nível de açúcar no sangue dos últimos quatro meses (o tempo de vida de uma hemoglobina). É mais ou menos como utilizar os corpos de vítimas de homicídio por armas de fogo para estudos de balística, fazendo vista grossa para o crime. Outro cadáver é a frutosamina, um dos produtos iniciais da glicação: tem sido usada para monitorar o açúcar das duas últimas semanas.
A reação de Maillard é um tipo de reação em cadeia. Os "produtos iniciais" da reação entre acúcares e proteínas são compostos intermediários instáveis proporcionais à concentração de glicose momentânea - as aldiminas (base de Schiff). Tais compostos poucos dias depois transformam-se em frutosaminas (composto de Amadori). A continuação da cascata de reações conduz à formação dos terríveis AGEs - Advanced glycation end products ou "produtos finais" do processo de glicação, compostos muito reativos que exercem diversas atividades biológicas deletérias. A doutora Elisa Biazzi fala deles de uma maneira engraçada: "As células, em determinados momentos, lançavam um elemento estranho, emaranhado como uma teia de aranha e muito pegajoso. Seguindo pelo sangue, (os AGEs) grudavam nas paredes das artérias, alcançavam as articulações, fixando-se ali. Chegavam até o cristalino do olho, provocando cataratas, verdadeiras sementes de envelhecimento precoce".
Eles gostam de se acumular na parede arterial (colágeno) e nas membranas basais glomerulares, induzindo à nefropatia; noutros capilares como os da retina levando à retinopatia, etc.
As distintas etapas da reação de Maillard afetam todas as macromoléculas do organismo dotadas de grupos amina reativos e vida longa. Ou seja: as proteínas do plasma sanguíneo, as do compartimento intracelular e as da matriz extra celular (proteínas circulantes) e as estruturais componentes das membranas (colágeno, elastina, mielina, etc).
A glicação de proteínas modifica significativamente suas propriedades físico-químicas e conseqüentemente sua atividade biológica. Os produtos iniciais da glicação afetam as proteínas modificando sua carga elétrica, solubilidade e mobilidade. Já os produtos finais, através de ligações cruzadas entre proteínas, modificam sua estrutura original, afetando suas funções vitais.
As proteínas estruturais "modificadas" comprometem também as funções próprias do tecido de que fazem parte e conseqüentemente do órgão do qual o tecido é componente.
A glicose que circula pelo sangue depende, para entrar nas células musculares, de uma ajudinha da insulina. Os músculos estriados são apenas uma fração (aproximadamente 30%) da área do corpo atingida pela glicose. Mas há um mundo de outras células e tecidos nos quais o açúcar entra sem pedir licença. A lista é grande: a começar pela própria hemoglobina que é livremente permeável à molécula de glicose sendo por isso suscetível a concentrações glicêmicas semelhante ao plasma, o sistema nervoso central e periférico, o sistema micro e macrovascular, os músculos lisos, os ácidos nucléicos, os fosfolipídios, a medula renal, o tecido conjuntivo, o colágeno, o cristalino, os hormônios, as enzimas etc. Justamente as partes do corpo onde ocorrem as complicações do diabetes. São de natureza insulino-independentes porque se nutrem exclusivamente de glicose e possuem transportadores (Glut) que não são regulados pela insulina.
É nesse universo protéico que o açúcar faz a festa. Por não dependerem de insulina as portas estão abertas para o inimigo. Quer a vítima esteja alimentada ou em jejum os transportadores de glicose estão lá, ligados à membrana, a postos.
Em situação de glicemia normal a velocidade de entrada de glicose nas células é proporcional à demanda de energia. Se existir hiperglicemia a glicose entra livremente pela célula e depois de fosforilada pela enzima aldose redutase; após atingir determinada concentração passa a inibir a ação dessa enzima. E continua a entrar até ficar em equilíbrio com a glicose circulante. Como a água da enchente de um rio que invade uma casa até o limite do nível das águas do próprio rio.
O excesso de glicose livre no interior das células é o maior responsável pelas lesões típicas das complicações do diabetes. A glicose livre (não fosforilada) ativa nas células a via dos polióis, com formação excessiva de sorbitol e frutose. O aumento de sorbitol e frutose altera o metabolismo energético celular, a integridade da membrana e outras funções. O sorbitol se acumula na bainha de Schwann do tecido nervoso, acarretando mudança na função dos nervos, com alteração na condução nervosa, mudança na sensibilidade e perda de fibras nervosas. Isso se explica porque esse poliól ocasiona estresse hiperosmótico nas células e outros problemas (diminuição do monoinositol celular), ocasionando dano. As demais glicoses livres ligam-se não-enzimaticamente a proteínas, ácidos nucléicos e até fosfolipídios, gerando, em última instância, AGEs - produtos finais de glicação avançada.
Tanto a glicose quanto a frutose podem auto-oxidar-se na presença de oxigênio, originando um dicarbonilo e o radical ânion superóxido, ambos responsáveis pelo estresse oxidativo na célula.
O radical livre que resulta da oxidação da frutose é responsável pela maior parte da formação de ligações cruzadas entre proteínas, os AGEs. Esses produtos finais da glicação avançada alteram a estrutura e as funções das proteínas e induzem ainda processos de antigenicidade que perpetuam a lesão.
A médica portuguesa Maria da Silva Azevedo, em artigo sobre a bioquímica do diabetes, cita Unger como tendo sido o primeiro a falar de diabetes como uma síndrome secundária a uma hiperglicemia. E também Cahill, que já havia proposto uma etiopatogenia comum para explicar o diabetes e suas complicações. Cita também, nas conclusões de seu artigo, dados de experiências recentes com as ilhotas de Langerhans incubadas na presença de concentrações de glicose, onde se verificou a ativação de citocinas e produção de NO (óxido nítrico) provocando um estresse oxidativo e lesão das células beta. As células beta do pâncreas, lembra a médica, são muito vulneráveis à oxidação por possuírem poucas defesas anti-oxidantes.
E finalmente menciona outras experiências em que ratos, mantidos com hiperglicemia induzida, apresentaram lesão das células beta causadas pelo estabelecimento de um processo auto-imune. Silva Azevedo conclui lembrando que a glicação não-enzimática de proteínas (GNP) poderá ainda ser responsável pela resistência à ação da insulina, posto que atinge tanto a insulina quanto os receptores dela.
Já vimos com o doutor Helion Póvoa que a glicação de proteínas não é privilégio de diabéticos, ela atinge também os não diabéticos. Colágeno glicado tem sido observado em indivíduos com hiperglicemia leve não diagnosticados como diabéticos. Sabe-se também que pequenas elevações da glicemia podem causar disfunção endotelial e possivelmente, dar início à aterogênese. A hiperglicemia, mesmo não havendo diabetes, causa glicação das LDL que as torna agressivas ao endotélio e a outras células.
A futura teoria geral das doenças crônicas chegará necessariamente a uma sistematização dos males causados pelo açúcar. A porta de entrada é a boca, onde a sacarose desempenha o papel de combustível exclusivo com o qual as bactérias cariogênicas produzem cárie. Tendo chegado ao sangue e glicado a hemoglobina, à exceção dos músculos estriados, todo o organismo fica exposto ao assédio da glicose livre. Ficam passíveis de glicação: o colágeno que, alterado, irá contribuir para tromboses e outras doenças vasculares; a LDL, que glicada se torna imunogênica - o organismo passa a produzir anticorpos anti-LDL glicada - ; a glicação do cristalino que antecede as cataratas senis; a glicação das células beta pancreáticas explica o diabetes; a glicaçao das membranas basais caracteriza as microangiopatias; a glicação da insulina explicaria sua ineficácia; e a glicação dos receptores de insulina a resistência insulínica; a glicação dos nervos causa neuropatias; colágeno tissular glicado é típico de envelhecimento. E assim por diante.
Já havia dito que a medicina não havia mapeado a festa que o açúcar faz no organismo. Estava pensando apenas em digestão e metabolismo. Essa teoria geral a que me refiro é muito mais complexa: será o mapeamento a ser feito pelo pessoal da bioquímica fina. Um mapa que faça a síntese das várias hipóteses alternativas e complementares para os mecanismos pelos quais o açúcar leva às diferentes doenças crônicas, a começar pelo emaranhado das reações de Maillard; a aceleração da função da enzima aldose redutase (via dos polióis); o estresse oxidativo (radicais livres); o estresse carbonílico; o transtorno de atividade das citocinas e a pseudo-hipoxial; e o transtorno no metabolismo das lipo-proteínas.
Entre os cientistas já existe o consenso de que a glicose em si mesma é tóxica e a frutose mais tóxica ainda. E nós leigos sabemos que o açúcar do açucareiro é um mero fornecedor de glicose e frutose usado para encharcar os alimentos que irão impregnar nossos corpos com essas substâncias tóxicas. E agora, José?
Creio não estar forçando nenhuma barra ao sustentar que o consumo diário da dieta açucarada moderna é a grande fonte desse manancial de glicose (e frutose) que vai aos poucos "glicosilando", "estressando" e "oxidando" o organismo de quase toda a humanidade dos dias de hoje. Em minha modesta opinião de leigo, o açúcar é o fio-de-ariadne que conduzirá à teoria geral explicativa das doenças crônicas, metabólicas, degenerativas, auto-imunes e quiçá as doenças raras. A natureza não ia levar bilhões de anos aperfeiçoando uma máquina para depois seus componentes começarem a se estranhar entre si. Foi só depois do advento da ração açucarada que teve início a degeneração ao vivo da raça humana. Degeneração causada por reações envolvendo açúcar e proteínas transformando-as em corpos estranhos para o sistema auto-imune levando-o a produzir anticorpos contra componentes do próprio corpo. Uma espécie de loucura que tomou conta do organismo. Resta à indústria da doença tentar provar que o mar de glicose que transforma seres humanos em bonecos de açúcar vem das bananas, da lentilha e do arroz e não dessa substância isolada de um capim e adicionada aos alimentos.
(Artigonal SC #830935)
Fonte Artigonal
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