Alimentos coloridos protegem o cérebro

Uma dieta saudável é, por definição, uma dieta variada que ofereça ao organismo os diversos nutrientes de que precisa. Mas, da mesma forma que há alimentos cardioprotetores, também há os neuro-saudáveis. Esses produtos geralmente têm cores vivas e propriedades que protegem especificamente o cérebro

Ester Riu

Da mesma maneira que falamos de alimentos cardio-saudáveis, podemos falar de alimentos que são bons para nosso cérebro e que podem ajudar os neurônios a manter as conexões entre si e a retardar a deterioração das funções cognitivas associadas ao envelhecimento. Poderíamos chamá-los de alimentos neuro-saudáveis. Não se trata de uma dieta mágica nem de alimentar falsas promessas de manter o cérebro em perfeito estado, mas de identificar certos nutrientes que podem ter um efeito favorável em nossa matéria cinzenta.

O estudo da relação entre a alimentação e o cérebro é relativamente novo, mas há cada vez mais publicações científicas que demonstram que o que comemos afeta a saúde cognitiva, tanto negativa como positivamente, e que para manter o cérebro em bom estado, além de fazer "sudoku" e jogar Brain Trainer, podemos começar a prestar atenção em algo tão corriqueiro quanto a lista de compras.

"A comida é como uma substância farmacêutica que afeta diretamente o cérebro, e o fato de que pode alterar nossa saúde mental é muito animador, pois significa que as mudanças alimentares podem chegar a ser uma estratégia viável para proteger o cérebro, melhorar a capacidade cognitiva e deter os efeitos do envelhecimento", afirma Fernando Gómez-Pinilla, neurocientista da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), que publicou em julho um estudo na "Nature Reviews Neuroscience" no qual analisou mais de 160 trabalhos sobre essa questão.

Essa análise traz informações que podem ser muito valiosas na hora de decidir o que comprar para comer. Em produtos tão comuns quanto morangos, nozes e espinafre podemos encontrar uma fonte poderosa de alimentação para os neurônios.

Frutas silvestres
A cientista catalã Gemma Casadesús, que pesquisa a perda cognitiva e o envelhecimento no departamento de neurociências da Universidade Case Western Reserve, em Cleveland (Ohio, EUA), afirma que dá todos os dias a seus filhos morangos, framboesas e oxicocos [arando, uva-do-monte, "cranberry"]. Por que essas frutas, exatamente? A pesquisadora é muito consciente do poder antioxidante das frutas silvestres, depois que demonstrou em sua tese de doutorado, há quatro anos, que ratos que tinham sido alimentados com oxicocos eram capazes de produzir novos neurônios - processo conhecido como neurogênese - no hipocampo, a região do cérebro associada à memória.

Casadesús realizou sua tese sob a supervisão de James Joseph, chefe do Laboratório de Neurociência do Jean Mayer USDA Centro de Pesquisa de Nutrição Humana e Envelhecimento na Universidade Tufts, em Boston, e um dos primeiros a descobrir o efeito protetor dos antioxidantes no cérebro.

Joseph publicou um estudo em 1999 no "Journal of Neuroscience", segundo o qual ratos de 19 meses - equivalentes a humanos de 65 ou 70 anos - que foram alimentados com extratos de nutrientes ricos em antioxidantes haviam demonstrado melhora na memória em curto prazo. Mais especificamente, os que haviam tomado extrato de oxicocos melhoraram nas tarefas de equilíbrio e coordenação. Desde então Joseph toma todas as manhãs um punhado de oxicocos com o café da manhã.

Nos últimos dez anos Joseph estudou as propriedades dos antioxidantes de frutas e verduras para tentar entender como podem ter esse efeito tão benéfico no cérebro. "Por trás das doenças cardiovasculares, da diabetes, do câncer, do Parkinson e do Alzheimer estão a inflamação e o estresse oxidante, e observamos que os arándanos têm a capacidade de apagar esses sinais inflamatórios e oxidantes e acender outros positivos que os bloqueiam", explica.

Origens do Alzheimer
Tanto Joseph quanto Casadesús estão muito interessados em estudar o Alzheimer, e seu objetivo é se concentrar nos primeiros estágios da doença para ver se, tentando conter os primeiros sinais de perda de função cognitiva, se pode chegar a retardar o aparecimento dos efeitos mais devastadores dessa patologia neurodegenerativa. "É claro que não se pode curar o Alzheimer com a comida, mas o que nós gostaríamos é que cada pessoa possa reduzir sua probabilidade de desenvolver a doença e inclusive consiga preveni-la se souber que certos hábitos podem ajudá-la", afirma Joseph.

Ele e Casadesús tomam certa distância em relação às pesquisas atuais de Alzheimer, concentradas na formação de placas amilóides, porque crêem que a doença começa muito antes de que se acumule a proteína beta-amilóide e que os processos inflamatórios e oxidantes poderiam ter muito a ver com isso. Casadesús sabe que esses processos não são os únicos causadores, mas sua intenção é estudá-los antes que a proteína amilóide comece a se acumular, para poder entendê-los melhor e ver qual é seu papel.

"Acreditamos que a amilóide é produzida como compensação para combater um forte estresse oxidante, e o que queremos é estudar cronologicamente um modelo específico de ratos transgênicos que sofrem uma deterioração cognitiva semelhante ao Alzheimer - o SAMP8 - para ver que efeitos têm os antioxidantes", explica Casadesús.

A pesquisadora prevê utilizar resveratrol, o benéfico componente do vinho tinto, para conter a ação dos radicais livres. Esse trabalho está sendo feito em colaboração com uma equipe da Universidade de Barcelona e em parte com financiamento de La Marató da TV-3.

Apesar de o oxicoco consumido na Espanha ser diferente da "blueberry" americana (mirtilo) em que se baseiam esses estudos, o dr. Joseph afirma que os espanhóis podem se beneficiar dos antioxidantes consumindo morangos e nozes e bebendo vinho tinto. O pesquisador foi um dos primeiros a indicar as vantagens dos alimentos coloridos, como as frutas silvestres, espinafres ou brócolis. Casadesús insiste na importância da cor e acrescenta que outros estudos também demonstraram os benefícios dos fitoquímicos presentes nas maçãs, uvas pretas e romãs.

Outro nutriente importante para o cérebro são os ácidos graxos ômega-3, que se encontram em alimentos como linhaça, as nozes ou o kiwi. Segundo Gómez-Pinilla, eles atuam diretamente nas sinapses do cérebro, processo que é fundamental para o aprendizado e a memória. Um dos ômegas-3 mais importantes é o DHA, muito presente na linhaça. "O DHA é um componente das membranas dos neurônios, mas tanto o cérebro como o corpo humano são deficientes na hora de produzi-lo, por isso temos de obtê-lo diretamente na alimentação", indica o pesquisador de origem chilena.

Exemplo de Okinawa
Há estudos que demonstraram a relação entre uma dieta deficiente em ômega-3 e o aumento do risco de doenças. Nesse sentido, é interessante observar o que acontece em Okinawa, uma ilha japonesa onde se consome muito ômega 3 (mais que a média japonesa) e as pessoas fazem exercícios regularmente. Os habitantes da ilha têm uma das expectativas de vida mais altas do planeta, e o índice de distúrbios mentais é muito baixo.

Continuando na Ásia, também devemos prestar atenção à cúrcuma, uma especiaria procedente da Índia e um dos componentes do molho curry. Essa especiaria, que às vezes é chamada de "aspirina da Ásia", está sendo alvo de muitos estudos por seu valor como antiinflamatório e antioxidante. Na UCLA, uma equipe dirigida por Greg Cole pesquisa seus efeitos em doentes de Alzheimer e os resultados observados até agora são promissores: além de ser um poderoso antiinflamatório, a cúrcuma também parece reduzir o acúmulo de amilóide e a perda de marcadores sinápticos. Os especialistas indicam que a baixa prevalência de Alzheimer na Índia poderia ter a ver com o alto consumo de cúrcuma. O estudo de Gómez-Pinilla também salienta os benefícios para o cérebro dos alimentos ricos em ácido fólico (espinafre, suco de laranja, levedo) e de outros nutrientes, como os flavonóides (cacau, chá verde, frutas secas).

Esses três pesquisadores concordam em que é muito melhor comer diretamente o alimento do que tomá-lo em forma de suplemento. "Os diversos componentes de frutas como o oxicoco atuam no conjunto e em sinergia", afirma Casadesús.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Fonte: El País -05/10/2008

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