Ausência de estudos sobre o aspartame embaraça a Europa


A utilização do aspartame, uma substância adoçante presente em praticamente todos os produtos light, foi estranhamente aprovada sem que existam estudos científicos sobre os seus efeitos. E hoje, muitos são aqueles que denunciam os riscos para a saúde humana, nomeadamente para as grávidas. Uma situação delicada para as autoridades sanitárias, que tentam ganhar tempo para que os industriais possam mudar as suas receitas.

Quando a Food and Frug Administration (FDA) aprovou o aspartame (E951), esta agência americana definiu uma dose diária aceitável de 40 mg por quilo de peso corporal por dia. Como refere um artigo de Sophie Verney-Caillat, no site Rue89,se tivermos em conta que esta dose corresponde a cerca de 30 latas de Coca-Cola light por dia para um adulto de 60 quilos, poderíamos considerar que o produto é praticamente inofensivo.

No entanto, a Autoridade europeia para a segurança dos alimentos (Efsa) apercebeu-se de que “provavelmente” a dose diária aceitável de aspartame foi determinada ao acaso. A investigação da jornalista Marie-Monique Robin, “O veneno nosso de cada dia” (“Notre poison quotidien”), deu o primeiro sinal de alerta. 

O edulcorante mais utilizado no mundo foi inventado pela empresa Searle, cujo patrão era na altura Donald Rumsfeld (que mais tarde acabou ao lado de George Bush, na chefia da guerra no Iraque). Curiosamente, a aprovação do aspartame ocorreu pouco depois da chegada ao poder do seu amigo Ronald Reagan. Para Marie-Monique Robin, não há dúvidas: tratou-se de “uma decisão puramente política. Todos os toxicólogos da FDA concluíam que este produto era potencialmente cancerígeno. E, como por magia, após a eleição de Reagan, o aspartame foi autorizado”.

Inúmeros estudos publicados desde então provam que a dose diária aceitável não protege a saúde dos consumidores e que chega mesmo a representar um risco de aborto espontâneo e de parto prematuro para mulheres grávidas. No entanto, nenhum destes estudos foi considerado como “suficientemente científico” aos olhos das autoridades sanitárias europeias.

Decidindo atacar na mesma moeda, a Rede francesa saúde e ambiente (Réseau environnement santé) pediu a estas autoridades que provassem que os estudos iniciais eram suficientemente científicos. Laurent Chevallier, o médico responsável pelo alerta, pediu a Hugues Kenigswald, o chefe da unidade de aditivos alimentares da Efsa, os factos que levaram à autorização do aspartame. A resposta é no mínimo curiosa: “A Efsa não dispõe do dossier de pedido de autorização do aspartame que deveria conter estes estudos. Para além disso, os contactos que efectuámos com os nossos colegas da Comissão europeia parecem indicar que a própria Comissão também já não os tem em mãos. Não hesitem no entanto em contactar o Sr. Michael Flüh, chefe da unidade responsável pelos aditivos alimentares”.

Várias semanas mais tarde, este último continua sem saber onde se encontram os estudos em questão. A eurodeputada Corinne Lepage, defensora do princípio de precaução, como ainda há pouco referimos neste blogue, insurge-se: “A Efsa nunca chegou a ter acesso aos estudos sobre os quais foi fundada a autorização ou então nunca os chegou a ler. Assim sendo, como pode ela ousar rejeitar os novos estudos? Se for necessário obter-se todas as provas de que um produto é nocivo para que este seja proibido, então deixamos de falar de precaução!”.

Corinne Lepage conseguiu que a comissão ambiente do Parlamento europeu votasse uma cláusula de alerta às mulheres grávidas. Mas esta medida, que deverá ser definitivamente adoptada no âmbito da directiva relativa à etiquetagem dos produtos, acabará por “ser retocada em plenário”, assegura a eurodeputada, devido à pressão dos lobbies.

De facto, como insiste a jornalista de Rue89, quando procuramos compreender por que é que a Efsa está tão pouco à vontade relativamente a este dossier, acabamos por descobrir as relações duvidosas que existem entre estes peritos e a indústria. Entre os vinte peritos da comissão aditivos alimentares da Efsa, onze têm conflitos de interesse. Alguns deles "esqueceram-se" mesmo de declarar que também são consultantes para a marca Coca-Cola.

Para evitar outro escândalo do tipo Mediator (um medicamento que levou à morte de muitas pessoas, mas que foi comercializado durante anos devido aos lobbies farmacêuticos), a agência europeia decidiu antecipar para 2012 (em vez de 2020) a reavaliação científica dos dados sobre o aspartame. E a agência francesa acabou de lançar a reavaliação dos benefícios e dos riscos nutricionais dos edulcorantes intensos, entre os quais esta mesma substância.

Mas, para Marie-Monique Robin, trata-se apenas de se ganhar tempo, pois “quando a stévia tiver substituído o aspartame, o escândalo afectará menos os industriais”.

Fonte:
- “Etudes bidon, conflits d'intérêts : l'aspartame dans de sales draps”, Rue89, 27 de Junho, 2011

Foto: "Taste zero sugar" (Jon Wyatt/flickr)

Texto de  

Susana Nunes

 http://da-cor-do-limao.blogspot.com/2011/07/ausencia-de-estudos-sobre-o-aspartame.html

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