Hibisco: do uso ornamental ao medicinal




 Márcia Vizzotto

Marina Couto Pereira


O hibisco comestível (Hibiscus sabdariffa), pertencente à família botânica Malvaceae, é um arbusto anual, nativo dos continentes africano e asiático, e encontra-se distribuído nas regiões tropicais e subtropicais de ambos os hemisférios, tornando-se naturalizado em muitas áreas das Américas. Esta planta apresenta boa adaptação às condições brasileiras, uma vez que é encontrada em jardins residenciais nas várias regiões do Brasil; no entanto, não existem recomendações de cultivo nem estudos mais aprofundados sobre as suas substâncias bioativas.

Esta planta é conhecida popularmente no Brasil como hibisco, hibiscus, rosele(a), groselha, papoula, flor da jamaica, azedinha, quiabo azedo, caruru-azedo, caruru-da-guiné e quiabo-de-angola, além de receber outros nomes, como jamaica (Espanha e México), cardade (Italia), karkade (Arábia), roselle (Inglaterra) ou L'oiselle (França). Vale lembrar que este hibisco não é o hibisco ornamental (Hibiscus rosa-sinensis), tão comum nos jardins do Brasil, conhecido popularmente como hibisco-da-china ou rosa-sinensis.



No hibisco comestível, as diferentes partes da planta, como folhas, caules, raízes, frutos, sementes e os cálices são preparados de diversas formas em várias partes do mundo. As folhas são ricas em vitaminas A e B1, sais minerais e aminoácidos, podendo ser consumidas cruas em saladas ou se tornar, assim como o caule, um ótimo ingrediente para o preparo de cozidos, sopas, feijão e arroz. Na região Nordeste do Brasil, principalmente no estado do Maranhão, as folhas do hibisco, lá conhecido como "vinagreira ou azedinha", são usadas no preparo de diversos pratos típicos da culinária, especialmente o cuxá. Possuem também ações emolientes, diuréticas e sedativas. As sementes, ricas em proteínas e um tanto amargas, têm servido como refeição para alimentação humana na África, através do seu esmagamento e destilação para uso em sopas, misturadas com farinha de feijão ou torradas como um substituto para o café. Na Birmânia, as sementes são utilizadas para a debilidade e em Taiwan como diurético e laxante. As flores possuem antocianinas e, também, apresentam efeito diurético e diminuem a viscosidade do sangue, reduzindo a pressão arterial. Os frutos são comestíveis e podem ser utilizados como antiescorbútico. As raízes são utilizadas para o preparo de tônicos e aperitivos nas Filipinas.
A parte mais estudada do hibisco são as brácteas ou cálices. De coloração vermelha e sabor azedo; atraindo a atenção das indústrias de alimentos e farmacêuticas, as quais começam a vislumbrar a possibilidade de exploração racional desse vegetal como matéria-prima para elaboração de alimentos e como fonte natural de corantes, demonstrando assim um grande potencial econômico. Os cálices podem ser utilizados na decoração de pratos, como saladas de alto valor antioxidante, ou no preparo de geléias, doces, sucos, xaropes, gelatinas, vinho, vinagre, molhos ou ser consumidos in natura. Esta parte da planta é muito utilizada na medicina popular.



Uso medicinal dos cálices

Os cálices do hibisco, durante muito tempo, foram utilizados na medicina popular para tratar hipertensão arterial, ganhando grande aceitação no tratamento de muitas doenças em quase todo o Brasil. No sul do México, a partir dos cálices secos desta planta, é preparada uma bebida popular que também é tradicionalmente utilizada pela população para o tratamento da obesidade. Da mesma forma, na Nigéria, o consumo de uma bebida preparada com os cálices do hibisco é elevado.
Estudos têm comprovado o uso do hibisco como agente diurético, uricosúrico, antimicrobiano, leve laxante, sedativo, anti-hipertensor, antitússico e também na diminuição dos níveis de lipídios totais, colesterol e triglicérides, no tratamento gastrointestinal e de pedra nos rins, assim como para tratar danos no fígado e efeitos da embriaguez. Mais recentemente, há indicativo de que o hibisco parece agir como antioxidante, antimutagênico, antitumoral e antileucêmico.
Alguns componentes antioxidantes foram encontrados no cálice de hibisco, como as antocianinas delfinidina 3-xilosilglucosídio, cianidina 3-xilosilglucosídio,  cianidina 3-glicosídeo e a delfinidina 3-glicosídeo. A hibiscetina, sabdaretina, gossipetina, quercetina, ácido ascórbico (teores mais elevados do que na laranja e na manga), ácido protocateico e taninos, também foram identificados e sugeridos como possíveis substâncias responsáveis pelas atividades benéficas à saúde. O chá obtido a partir do cálice da flor contém polissacarídeos em boas quantidades, açúcares redutores, como a glicose e a frutose, além de ser rico em cálcio, magnésio, niacina, riboflavina, ferro e vitaminas A e C, ácidos como o tartárico, succínico, málico, oxálico, cítrico e hibíscico, além de quantidade significativa de fibras alimentares. O cálice do hibisco apresenta alto teor de pectinas (mais de 3%), fazendo com que a geléia tenha uma consistência naturalmente firme. Esta parte da planta pode ser utilizada como fonte de extração deste composto para aplicação na indústria alimentícia.
O chá do cálice do hibisco contém altos níveis de antioxidantes, como os flavonóides, que são substâncias importantes para nosso organismo. Flavonóides, como as antocianinas, são responsáveis pela coloração do vinho, da melancia e da pitanga, entre outras frutas. Esses antioxidantes ajudam nosso organismo a lutar contra os radicais livres, os quais podem causar danos às células de nosso corpo, levando a doenças crônicas, como as cardiovasculares e o câncer. Sendo assim, os antioxidantes ajudam a manter o nosso organismo saudável. E vale lembrar que o chá de hibisco é livre de cafeína!
A Embrapa Clima Temperado tem interesse em encontrar novas opções de alimentos saudáveis para serem produzidos e consumidos pela população brasileira. Atualmente, todo o hibisco consumido é produzido na África e Ásia, e importado via Alemanha para o Brasil. Neste contexto, um trabalho exploratório está sendo desenvolvido com o objetivo de caracterizar frutas e hortaliças nativas e exóticas, que são, ainda, pouco conhecidas na Região Sul e no Brasil. O volume de informações relativas à produção e manejo do hibisco no Brasil é incipiente, mas esta hortaliça apresenta-se como uma boa opção para tornar saladas ainda mais saudáveis, contendo uma gama de compostos antioxidantes. O que se espera é caracterizar esta hortaliça e, assim, incentivar o seu consumo e sua produção. E quem sabe ela não se torna um importante alimento funcional? Vale lembrar que alimento funcional é aquele que, além das características nutricionais básicas, quando consumido como parte usual da dieta, produz efeito fisiológico/metabólico benéfico à saúde, devendo ser seguro para consumo sem supervisão médica.

Márcia Vizzotto

Pesquisadora da Embrapa Clima Temperado


Marina Couto Pereira

Estagiária do Laboratório de Tecnologia de Alimentos



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

VIZZOTTO, M.; PEREIRA, M.C.  Hibisco: do uso ornamental ao medicinal. 2008. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2008_4/hibisco/index.htm>. Acesso em: 26/1/2010

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