A cura que brota na mata



ECOLOGIA MÉDICA

A cura que brota na mata

Essa expressão já sugere saúde, natureza, ciência. Acompanhe a interessante jornada da jornalista Maria Helena Pugliesi ao Centro de Ecologia Médica Florescer na Mata. Até um remédio para sua insônia ela colheu.

Por Maria Helena Pugliesi
Revista Bons Fluidos - 04/2008

O momento era mesmo perfeito para ir conhecer o trabalho gratuito que o ambulatório do Centro de Ecologia Médica Florescer na Mata vem desenvolvendo desde julho de 2007 em parceria com o Departamento de Ecologia da Universidade de São Paulo.

Minha insônia não deu trégua aquela noite e quem sabe ali, por meio da prescrição de remédios e chás naturais, eu conseguisse a fórmula para dormir como sempre sonhei.

Resolvi então sair cedo de casa para chegar pontualmente às 8 horas na sede da entidade: uma casa simpática em Caucaia do Alto, a 50 km de São Paulo. A propriedade fica colada à Reserva Florestal do Morro Grande - 10,7 mil hectares com fauna e flora preservadas.

Fui recebida pela bruma típica da altitude (1.040m acima do nível do mar) e pela gentileza de uma senhora, que tomou nota de meus dados pessoais e do motivo de minha vinda. Ela me pediu que aguardasse no salão ao lado até ser chamada. Juntei-me assim às outras 19 pessoas que tinham sido agendadas para aquele sábado - algumas estavam ali pela primeira vez, outras faziam retorno.

Sentados em cadeiras dispostas em círculo, esperamos pela primeira atividade do dia: uma palestra sobre o respeito pelo meio ambiente, apresentada pelo médico homeopata Fernando Bignardi e pelo agrônomo Edmilson José Ambrosano. Bem, mas eu tinha ido até lá para tratar da minha insônia, o que a preservação da natureza tinha a ver com isso? Tudo, foi o que descobri escutando esses dois.

Na verdade, mais do que palestrar, Bignardi e Ambrosano foram contando causos e histórias que deixaram muito clara a importância das matas de solo vivo e puro para nossa saúde. Alimentos cultivados nessas condições, disseram eles, contêm todos os nutrientes necessários para vivermos saudáveis, diferentemente dos que são produzidos pela agricultura comercial.

O objetivo desses encontros é incutir um novo olhar às áreas verdes naturais. Aprendi que o respeito é a base da sustentabilidade e o alicerce da saúde é o reconhecimento do outro, seja ele um homem, uma planta, um animal ou o meio ambiente como um todo. A palestra acabou se transformando num gostoso bate-papo.

Os que já seguiam a orientação do ambulatório deram testemunho de que novos hábitos amenizaram seus males. O empresário Onivaldo Corrêa Dias contou que depois da primeira consulta, em setembro, emagreceu 9 kg. O segredo, ele disse, está em sua nova postura de vida: consome hortaliças e frutas de sua própria horta, substituiu o frango industrial pelo caipira e toma religiosamente os remédios fitoterápicos prescritos.

E assim, entre um depoimento e outro, escutei meu nome. A doutora Maria Fátima de Paula Ramos, homeopata e professora do Curso de Aperfeiçoamento para médicos, nutricionistas e veterinários da Escola Paulista de Medicina Fitorerápica da Universidade Federal de São Paulo, estava à minha espera.

Por trás de uma mesa forrada de frasquinhos cheios de extratos fitoterápicos, cedidos pelo Laboratório Arte Terapêutica, de São Paulo, a doutora Fátima me recebeu cordialmente. A consulta segue o padrão da homeopatia, com ingredientes extras.

Além das perguntas de praxe, a médica também dá uma aula sobre as ervas medicinais indicadas para o motivo da queixa. Saí do consultório com um vidrinho na mão - cujas gotinhas devo tomar todas as noites antes de dormir - e com o nome das plantas que deveria levar para casa.

Nessa altura, o grupo inteiro já tinha sido atendido e fomos todos colher e aprender como replantar e manipular nossas espécies. Eu ganhei mudas de picão-preto e Melissa officinallis (a erva-cidreira verdadeira). Já Sueli Meng Gonçalves, uma publicitária que também estava indo pela primeira vez em busca de um tratamento mais natural para sua TPM, levou Achilea millefolium (mil-folhas) e alecrim.

O passeio pela mata, a descoberta dos benefícios de plantas para as quais muitas vezes não damos a menor importância (é o caso do gervão, que nasce em áreas de pasto e com o qual se pode fazer um chá poderoso contra dores do nervo ciático) e a troca de informações e experiências não só com os médicos como também com os pacientes deram novo ânimo a todos.

Ao meio-dia, quando voltamos para o salão a fim de encerrar as atividades, éramos outros. Uma certa alegria pairava no ar, as fisionomias estavam descontraídas. O motivo, quem arriscou foi Benedita Narcisa Nunes, que procurou o Florescer na Mata para tratar a depressão: "É porque nossa alma se tranqüilizou".

Realmente, voltei de lá mais relaxada. À noite, preparei um chá com as folhas de minhas mudas - já plantadas na floreira da sacada -, tomei as gotinhas e dormi. Isso mesmo. Dormi até o dia seguinte.

O QUE É ECOLOGIA MÉDICA?

O termo foi cunhado em 1939 pelo microbiologista francês René Dubos (1901-1982). Durante suas pesquisas sobre infecções tropicais, que culminou no potente antibiótico gramicidina, ele descobriu o quanto o meio ambiente interage no tratamento das doenças. Desde então, a expressão vem sendo empregada sempre que questões ecológicas se relacionam com a medicina.

Trata-se de uma estratégia terapêutica que vê a doença não como um fenômeno individual, mas como a evidência de um desequilíbrio ecológico. O enfermo é apenas uma parte do processo. Para curá-lo, é preciso curar sua relação com o meio em que habita. Médicos e cientistas renomados são adeptos dessa filosofia.

Em 1950, o pesquisador americano Linus Pauling (1901-1994) constatou em estudos ortomoleculares que as queixas de muitos pacientes tratados com ansiolíticos eram, na verdade, carências vitamínicas decorrentes da microdesnutrição e intoxicação alimentar, conseqüência da produção agrícola mecanizada. A máxima se reafirmou: somos o que comemos.

No Brasil, a ecologia médica está implícita em trabalhos reconhecidos, como o do psicanalista Danilo Perestrelo, que em 1982 lançou o livro A Medicina da Pessoa (ed. Livraria Atheneu), no qual sugere que toda doença é um convite para o doente rever seus hábitos e seu estilo de vida.

O médico Fernando Bignardi, diretor do Centro de Ecologia Médica Florescer na Mata, há mais de 18 anos também percebeu, ao praticar a homeopatia juntamente com o psicodrama, a complexidade envolvida na gênese das doenças. "Observei como meus pacientes, estimulados pelo medicamento homeopático, recuperavam a sensibilidade natural e percebiam a importância da qualidade dos alimentos", conta.

Bignardi constatou ainda que grupos de pacientes expostos ao ambiente preservado da mata Atlântica apresentavam um quadro de recuperação mais rápido. "Foi assim que idealizei o conceito de Centro de Ecologia Médica: um local de natureza rural e silvestre, projetado para favorecer a reconexão das pessoas consigo mesmas e com a natureza da qual fazem parte."

CENTRO DE ECOLOGIA FLORESCER NA MATA

O atendimento gratuito do ambulatório da entidade funciona aos sábados e atende até 20 pessoas. As consultas devem ser marcadas com antecedência. Há também atividades pagas, como programas de educação ambiental e visitas ao parque zoobotânico, além de cursos correlatos.

O mais recente empreendimento do Florescer na Mata é a Ecovila, que compreende terrenos adjacentes da sede onde serão construídas casas ecologicamente corretas.

{ Centro de ecologia Florescer na Mata } tel. (11) 5589-8544, www.florescernamata.com.br.

Fonte: http://planetasustentavel.abril.uol.com.br/noticia/saude/conteudo_274071.shtml



Comentários

Postagens mais visitadas