O caso do sumiço das abelhas em estudo

O caso do sumiço das abelhas em estudo

Publicado em 11 de Setembro de 2007 às 15h59 em Biossegurança

Fonte: Revista Época

A descoberta de um vírus poderoso que infecta abelhas pode ajudar a solucionar um mistério que há dois anos preocupa os cientistas em várias partes do mundo - a mortandade sem precedentes das abelhas nos Estados Unidos e na Europa. Nos últimos meses, os agricultores americanos perderam cerca de 80% de seus enxames. Na França, aproximadamente 30% das colméias morreram no primeiro semestre deste ano. Também há suspeitas de perdas na Suíça, Espanha e Inglaterra. Ainda não se sabe se o Brasil foi atingido por esse vírus. Agricultores gaúchos e catarinenses relataram o desaparecimento de abelhas em níveis inéditos neste ano. Há estimativas de perdas em torno de 25% da produção de mel. O problema só não é maior no mundo porque os agricultores ainda conseguem comprar enxames novos para repor as perdas. Mas ninguém sabe por quanto tempo será possível encontrar colméias saudáveis para abastecer o mercado. Na semana passada, um grupo de pesquisadores americanos revelou ter identificado um vírus presente em 96% das abelhas mortas em todos os enxames dizimados. O artigo foi publicado na revista científica Science. Ao comparar o genoma de abelhas sadias e doentes, os cientistas encontraram o vírus israelense de paralisia aguda (IAPV). A praga foi descrita pela primeira vez há dois anos em Israel. Ela teria se espalhado pela Austrália e alcançado os EUA, que importam colméias de várias partes do mundo. Ainda não se conhece o poder destrutivo do vírus. Sabe-se apenas que ele ataca a parte motora das abelhas, deixando as asas trêmulas de modo progressivo. Em alguns casos, os insetos perdem a capacidade de voar, caem no chão e morrem. “O vírus é apenas a primeira peça do quebra-cabeça”, diz Diana Cox-Foster, da Universidade Estadual da Pensilvânia, nos EUA, que lidera o grupo de estudos sobre o sumiço das abelhas. O vírus não explica por que as abelhas morrem a quilômetros de distância da colméia. Em Israel, onde a praga atacou pela primeira vez, as abelhas-operárias tombavam à beira da colméia. “Quando uma colônia é afetada por um microrganismo, sempre há muitas abelhas mortas ao redor da colméia”, diz Walter Haefecker, diretor da Associação Alemã de Apicultura. Agora, as abelhas-operárias saem de casa aparentemente saudáveis e não voltam para alimentar as mais novas. Elas seguem sem rumo e morrem, provavelmente por inanição. Afinal, o que as está matando? A única certeza dos cientistas é que as abelhas estão debilitadas. A análise dos insetos mortos mostrou que, além do vírus israelense, as abelhas estavam infectadas por bactérias, fungos e protozoários. Algumas apresentavam cinco ou seis infecções ao mesmo tempo. “Os insetos estão estressados, e seu sistema imunológico pode ter entrado em colapso”, diz Fábia de Mello Pereira, da Embrapa. Há vários fatores que, aparentemente, estão enfraquecendo o sistema imunológico das abelhas. Todos eles, segundo os cientistas, têm o poder de acionar um comportamento atípico nas abelhas. O primeiro fator de estresse seriam as plantações transgênicas. Algumas plantas recebem um gene de bactéria, que produz toxinas para repelir insetos da família das mariposas e borboletas. Surgiram indícios de que o pólen dessas plantas geneticamente modificadas estaria debilitando as abelhas. Um estudo realizado na Universidade de Jena, na Alemanha, entre 2001 e 2004, mostrou que as abelhas adoeceram com mais facilidade quando se nutriram de pólen transgênico. Mas pode ter sido por outras causas. “Nenhum estudo é conclusivo ainda”, diz Fábia. O aquecimento global é o segundo suspeito. A alteração no regime de chuvas adia a maturação de algumas espécies de flores e pode matar colméias inteiras por desnutrição. Afinal, o pólen é a principal fonte de alimento desses insetos. Além disso, a prática de alugar colméias é mais um fator estressante para as abelhas. Elas são levadas de uma fazenda para outra de caminhão sempre que novas culturas estão em época de floração. O principal suspeito é o uso de agrotóxicos. Os pesquisadores desconfiam especialmente de uma classe de pesticidas derivados do tabaco, da classe dos neonicotinóides. Ele afeta o sistema neurológico dos animais. “Isso poderia explicar o porquê de as abelhas saírem da colméia e não voltar mais”, diz o cientista alemão Haefecker. Elas não conseguiriam achar o caminho de volta. Outra razão para desconfiar dos pesticidas é que a colméia vazia não é atacada por predadores. “Pode haver algo tóxico nelas.” As abelhas domésticas são os insetos mais importantes na produção de alimentos. Ao levar o pólen de uma flor a outra, elas induzem a formação de sementes e frutos. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), as abelhas polinizam os frutos de 73% dos alimentos que consumimos. “Nenhum inseto tem a capacidade de substituir as abelhas”, diz Ian Lipkin, diretor do Centro de Infecção e Imunologia da Universidade Colúmbia. A falta das abelhas seria mais catastrófica para a agricultura que o aquecimento global, afirma Diana. O físico Albert Einstein, um admirador das abelhas, certa vez disse: “Se a abelha desaparecer da superfície do planeta, então ao homem restariam apenas quatro anos de vida”.

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