União Europeia colocou a vida selvagem portuguesa em risco?

Mais de metade das espécies selvagens portuguesas foram classificadas como em risco de extinção desde que o país entrou para a União Europeia há 20 anos e o extenso desenvolvimento tornado possível pelos dinheiros europeus são pelo menos em parte os culpados, revelam grupos ambientalistas.

A lista de todas as espécies em grave risco ou à beira da extinção compilada pelo Instituto de Conservação da Natureza atinge perto de metade das espécies conhecidas a nível nacional e os ambientalistas dizem que a ameaça deriva do impacto de anos de desenvolvimento intensivo financiado pela União Europeia.

"Portugal tornou-se uma democracia em meados dos anos 70 do século passado e aderiu à União Europeia em meados dos anos 80, o que trouxe um grande leque de investimentos internos", diz Eduardo Gonçalves, membro da organização conservacionista WWF. "Todo esse dinheiro foi despejado na construção de estradas e barragens, muitas delas sem planeamento cuidado."

Desde 1986, quando Portugal aderiu à União Europeia, tem havido um aumento drástico dos fogos florestais, da construção de barragens e do abandono das terras agrícolas.

A pegada ecológica de Portugal é agora maior que países tão dinâmicos como o Japão ou a Alemanha. Se todos utilizassem recursos à taxa a que os portugueses o fazem actualmente, seriam necessários três planetas para nos sustentar.

Gonçalves descreve as antigas zonas rurais do sul do país como actualmente não mais que "desertos verdes" e acredita que há uma ligação directa entre a nova urbanização e a perda e fragmentação de habitats cruciais.

As montanhas acima do que agora é uma zona de turismo em massa foram em tempos uma das áreas mais ricas em biodiversidade de Portugal, lar do lince ibérico (o grande felino mais ameaçado do mundo) e das majestosas águias ibéricas e de Bonelli.

"A população destas espécies estão reduzidas literalmente a alguns indivíduos", diz Gonçalves. "Não são efectivos populacionais viáveis a longo prazo."

De facto, o grupo conservacionista SOS Lynx acredita que não existem linces residentes em Portugal devido ao declínio das populações de coelhos, sua presa principal.

Esta situação foi desencadeada pela introdução de espécies exóticas, em particular o eucalipto, que está a ser plantado extensivamente desde os anos 60 do século XX como parte de esquemas de enriquecimento rápido.

O eucalipto absorve as águas subterrâneas, privando a zona onde se implanta de ervas que são bom alimento para os coelhos de que o lince se alimenta.

Marcial Felgueiras, director do grupo ambientalista A Rocha, refere que estudos têm indicado que muitos tipos de borboletas pura e simplesmente desapareceram, situação que ele atribui ao abandono das quintas à medida que o turismo se revela uma melhor fonte de rendimento.

"Ninguém quer o solo para a agricultura, todos querem o solo para a construção", explica ele. E as perdas de efectivo populacional nos insectos pode ter um impacto gigantesco nas cadeias alimentares, levando ao declínio de outras espécies.

Michael Reeve, que dirige um serviço de informação para pessoas que pretendem estabelecer-se em Portugal, considera que foi o dinheiro disponível dos fundos europeus que transformou o país. "Com a chegada da União Europeia, as pessoas começaram a receber fundos e financiamento para melhorar as suas infra-estruturas."

Um desses projectos foi a construção da auto-estrada entre o aeroporto de Faro e as estâncias de férias como a zona de Portimão. Esta situação reflecte algo maior, ou seja, as pessoas quando vinham para o Algarve, sentiam-se atraídas por uma imagem de vida que rapidamente se tornava frustrante.

Reeve continua: "Viam um homem com uma carroça, os cães a correr na rua e as famílias em comunhão e pensavam 'não é disto que precisamos?'. Mas depois que estavam a viver lá, não queriam viver assim logo tudo mudou devido a exigências gerais. O motivo porque há supermercados a surgir em todas as esquinas é porque existem tantos expatriados."

Para além disso, ele acrescenta que os investidores externos "não parecem ter interesse nenhum sobre se estão a fazer boas coisas para a economia e para o ambiente portugueses."

Mas, com 11 milhões de visitantes por ano, o turismo é a principal industria actual de Portugal e permanece a sua prioridade.

Daniel Queiroz, vice-presidente do Gabinete do Turismo algarvio, diz que os portugueses querem que o seu país se modernize. "Estamos todos a fazer um grande esforço para desenvolver o negócio no Algarve mas existe espaço para novos projectos. Temos muitos investidores e é claro que os projectos abrangem áreas com animais mas respeitamos os habitats e estamos a protege-los."

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